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NJ ESPECIAL – Súmula nº 44 do TRT-MG: É indevido o pagamento de adicional de periculosidade a vigia

A Lei 12.740/2012 alterou o art. 193 da CLT, que passou a considerar, em seu inciso II, como atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial. É pacífico o posicionamento de que, a partir da regulamentação da matéria pelo Ministério do Trabalho e Emprego, os vigilantes passaram a fazer jus ao pagamento do adicional de periculosidade. Mas será que é cabível a extensão do direito ao adicional de periculosidade a profissionais de segurança patrimonial, a exemplo dos vigias, que não se enquadrem na conceituação de vigilante atribuída pela Lei 7.102/83?
 
Recentemente, esse questionamento esteve presente nos processos julgados pela JT mineira e despertou entendimentos divergentes dos magistrados. Até que, na sessão ordinária realizada no dia 03/08/2015, o TRT-MG pacificou a questão. Nessa data, o Tribunal Pleno do TRT de Minas, em cumprimento ao disposto no art. 896, parágrafo 3º, da CLT, e na Lei 13.015/2014, conheceu do Incidente de Uniformização de Jurisprudência (IUJ) suscitado no processo 00558-2014-171-03-00-8-RO e, por maioria absoluta de votos, determinou a edição da Súmula nº 44, com a seguinte redação:
 
“ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. INCISO II DO ART. 193 DA CLT. VIGIA.É indevido o pagamento do adicional de periculosidade previsto no inciso II do art. 193 da CLT (inserido pela Lei n. 12.740/12) ao vigia, cuja atividade, diversamente daquela exercida pelo vigilante (Lei n. 7.102/83), não se enquadra no conceito de “segurança pessoal ou patrimonial” contido no item 2 do Anexo 3 da NR-16, que regulamentou o referido dispositivo”.
Histórico do IUJ: Processo de origem – Entendendo a matéria objeto do incidente
 
No caso analisado no processo nº 00558-2014-171-03-00-8, o juiz sentenciante reconheceu ser devido o pagamento do adicional de periculosidade para os rondantes, a partir de 03 de dezembro de 2013, data de publicação da Portaria 1.885 do Ministério do Trabalho e Emprego, regulamentadora da Lei 12.740/2012.
 
A ré é uma empresa pública do município de Itabira (MG) que possui plano de empregos, salários e carreiras próprio, homologado pelo prefeito municipal por meio do Decreto nº 1.376, de 11 de dezembro de 2009. Dentre os empregos existentes nesse plano consta o de rondante, cuja descrição sintética traz o seguinte teor: “compreende os empregos que se destinam a exercer a vigilância dos prédios, obras, praças, parques e outros estabelecimentos ou locais, percorrendo-os sistematicamente e inspecionando suas dependências para prevenir incêndios, furtos, entradas de pessoas estranhas e depredações”. Para esses empregados rondantes, o sindicato autor pediu o pagamento de adicional de periculosidade, com fundamento no art. 193, inc. II, da CLT, na nova redação dada pela Lei 12.740/2012.
 
O juiz sentenciante entendeu que os rondantes empregados da ré se enquadram nessa hipótese legal, ao exercerem atividades de prevenção de roubos e segurança patrimonial dos bens públicos municipais. Ao deferir o pedido, o magistrado acentuou que “a especificação do local de trabalho, no presente caso, é irrelevante, pois, estando o rondante num espaço aberto, como praça e parques, ou fechado, como escolas e prefeitura, sua atividade tem destinação específica de proteção do patrimônio público e o expõe a risco de violência física, a justificar a remuneração correspondente, por meio do adicional de periculosidade, estendido para esse profissionais, na forma da nova lei”.
 
Inconformada, a empresa Itaurb recorreu dessa decisão, argumentando que os empregados exercem a função de vigias, trabalhando desarmados, sem uniforme especial ou curso de formação específico. Ressaltou ainda a diferenciação entre as funções de vigia e vigilante. Mas a 5ª Turma do TRT-MG negou provimento ao recurso, por entender que os empregados contratados por empresa pública para realização de vigilância patrimonial fazem jus ao recebimento do adicional de periculosidade, pouco importando a utilização de armamento ou de uniforme.
 
O Ministro do Tribunal Superior do Trabalho Vieira de Mello Filho, ao examinar o Recurso de Revista interposto contra o acórdão proferido pela 5ª Turma do TRT-MG, decidiu proceder à uniformização da jurisprudência envolvendo o tema vigia – adicional de periculosidade – cabimento, atendendo às determinações contidas no §4º do art. 896 da CLT. Suspenso o julgamento do mencionado Recurso de Revista e devolvidos os autos a este Regional, o desembargador José Murilo de Moraes, 1º Vice-Presidente do TRT mineiro, determinou o registro e o processamento do IUJ, na forma da Resolução 9, de 29 de abril de 2015, assim como a suspensão do andamento dos processos que versem sobre a mesma matéria, até o julgamento do Incidente.
 
Distribuídos os autos ao desembargador relator Paulo Maurício Ribeiro Pires, foi determinada a remessa do processo à Comissão de Jurisprudência deste Tribunal (art. 11, inciso III, da referida Resolução GP n. 9/2015), que providenciou a juntada de documentos, assim como emitiu parecer. O Ministério Público do Trabalho, em parecer da lavra da Procuradora-Chefe Márcia Campos Duarte, opinou pelo conhecimento do Incidente, a fim de que este Tribunal confira interpretação uniforme à matéria, na forma do verbete sugerido pela Comissão de Uniformização de Jurisprudência.
 
Diferenças entre as funções de vigilante e vigia
 
Inicialmente, o relator fez uma breve exposição sobre as distinções entre as funções de vigilante e vigia:
 
O primeiro é o profissional contratado com a finalidade de proceder à vigilância patrimonial das instituições financeiras e de outros estabelecimentos, públicos ou privados, bem como a segurança de pessoas físicas, nos moldes estabelecidos pela Lei nº 7.102/83, que dispõe sobre a segurança para estabelecimentos financeiros e estabelece normas para constituição e funcionamento das empresas particulares que exploram serviços de vigilância e de transporte de valores.
 
O exercício de tal função pressupõe a observância de diversos requisitos, tais como: ser brasileiro; idade mínima de 21 anos; instrução correspondente à 4ª série do primeiro grau; aprovação em curso de formação de vigilante realizado em estabelecimento autorizado; aprovação em exame de saúde física, mental e psicológica; não ter antecedentes criminais registrados; estar quite com suas obrigações eleitorais e militares; prévio registro no Departamento de Polícia Federal (artigos 16 e 17 da Lei 7.102/83). Além disso, cumpre ao vigilante usar uniforme somente quando em efetivo serviço, sendo-lhe assegurado o porte de arma, também durante o trabalho (art. 19 da referida lei).
 
Por sua vez, o vigia exerce atividades de fiscalização de localidades e dos bens patrimoniais que ali se encontrem, nos moldes estabelecidos pela pessoa física e jurídica que o contratou, mas a ele não é possibilitado o exercício da vigilância armada e tampouco se exige preparação específica, inexistindo em relação à referida função qualquer regulamentação legal.
 
A respeito dos vigias e das tarefas por eles desempenhadas, a Comissão de Jurisprudência do TRT-MG destacou que, ainda que exerçam fiscalização ou vistoria do local onde prestam serviço, percorrendo e inspecionando as dependências da empresa ou da residência, tais atividades não têm o alcance da norma legal citada. Isto é, este profissional não tem o dever de agir ou reagir a ações efetivas ou tentadas contra a vida ou patrimônio de pessoas naturais e jurídicas. Acrescentou que o enquadramento sindical do vigia é determinado pela categoria econômica que pertence o empregador, conforme atividade preponderante que exerce. Portanto, não se trata de pessoa ocupante de categoria profissional diferenciada (§ 3° do art. 511 c/c art. 570, ambos da CLT), tal como ocorre com os vigilantes, regidos por legislação própria (Lei n° 7.102/83).
 
Teses Divergentes
Corrente minoritária: Pelo pagamento do adicional de periculosidade extensivo ao vigia.

 
O desembargador relator salientou que o entendimento adotado pela 5ª Turma do Regional mineiro, em julgamento de relatoria do juiz convocado Antonio Carlos Rodrigues Filho, foi no sentido de que empregados contratados por empresa pública para realização de vigilância patrimonial fazem jus ao recebimento do adicional de periculosidade, pouco importando a utilização de armamento ou de uniforme. Foi destacado no voto que, estando o rondante num espaço aberto como praça e parques, ou fechado, como escolas e prefeitura, sua atividade tem destinação específica de proteção do patrimônio público e o expõe a risco de violência física. Nesse sentido, a ementa atribuída ao julgado:
 
“EMENTA: ADICIONAL DE PERICULOSIDADE – ART. 193, DA CLT – NOVA REDAÇÃO – A redação do art. 193 da CLT foi alterada pela Lei nº 12.740/2012, que indicou algumas atividades como sendo de risco, estendendo o adicional de periculosidade aos profissionais da segurança pessoal ou patrimonial, possuindo vigência a partir da data da sua publicação (10.12.2012)”.
 
Os julgadores que adotam esse posicionamento minoritário salientam que as atividades exercidas por vigias patrimoniais envolvem riscos associados a roubos e outras espécies de violência física, fazendo eles jus, portanto, ao adicional de periculosidade desde a publicação da Lei 12.740/12, data de aquisição do direito (fundamentos extraídos do acórdão da 7ª Turma no processo TRT-RO-01371-2013-060-03-00-9; DEJT 22/05/2015).
 
Da mesma forma, a Sexta Turma, ao julgar o recurso interposto nos autos do processo TRT-RO-0001085-42.2013.5.03.0071, fundamentou que a ausência de treinamento específico direcionado a empregados investidos em atividade de segurança patrimonial e pessoal justifica, com maior intensidade, o deferimento do adicional de periculosidade, notadamente quando o empregado, zelador e vigia, encontra-se exposto a situações de risco em proporção superior aos típicos funcionários de segurança de empresas especializadas. Acrescentam ser cabível a interpretação analógica, à hipótese, do trabalhador exposto à energia elétrica, que faz jus ao respectivo adicional embora o empregador não pertença ao ramo de geração, transmissão e distribuição de energia, a teor do que dispõe a Súmula n. 18 do TRT de Minas Gerais.
 
Corrente majoritária: Não é devido o adicional de periculosidade a vigias
 
Por sua vez, a 9ª Turma, em julgado cujo relator foi o desembargador Ricardo Antonio Mohallem, adotou entendimento diverso, segundo o qual o enfrentamento de possíveis roubos ou a exposição a outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial é inerente à função do vigilante armado e qualificado para tanto, o que não é o caso do reclamante, vigia. Foi destacado no voto, ainda, que as atividades de vigia, ou mesmo de porteiro, destinam-se à guarda do patrimônio ou controle de ingresso de pessoas, de modo que esses profissionais não se enquadrariam nas hipóteses do item 2 do Anexo 3 da NR-16, não lhes sendo devido o adicional de periculosidade. A ementa do acórdão é a seguinte:
 
“VIGIA. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. NÃO CABIMENTO. O enfrentamento a meliantes ou mesmo o enfrentamento físico nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial é inerente à função do vigilante armado, qualificado para tanto, o que não é o caso do reclamante, vigia. Tanto é que sua função não se amolda ao conceito de ‘profissionais de segurança pessoal ou patrimonial’ dado pelo item 2 do Anexo 3 da NR-16, que regulamentou o inc. II do art. 193 da CLT. (PJe: TRT-RO-0011094-59.2014.5.03.0061-RO; Nona Turma; Rel. Ricardo Antonio Mohallem; Disponibilização DEJT: 26/03/2015)”.
 
Essa corrente majoritária no TRT mineiro, adotada inclusive pelo relator, exclui o vigia da percepção do adicional de periculosidade, por entender que ele não se enquadra no conceito de profissional de segurança pessoal ou patrimonial descrito na norma regulamentadora. O relator observou que esse posicionamento prevalecente pode ser representado pelos fundamentos adotados no acórdão proferido no processo TRT-RO-01359-2014-178-03-00-1, em que a 10ª Turma, em decisão unânime, manteve a sentença que indeferiu o adicional em questão a vigia que realizava rondas com o objetivo de proteção patrimonial da empresa em que trabalhava.
 
Conforme registrado no acórdão: “a função de vigia é menos abrangente do que a de vigilante, porquanto não lhe é exigida a efetiva ação no combate ao crime, como ocorre com os vigilantes, cujo mister se dá pela estrita observância das disposições contidas na Lei nº 7.102/83. Nos termos do mencionado diploma legal, o trabalho do vigilante exige registro na DRT – Delegacia Regional do Trabalho, aprovação em curso de formação própria e no exame de saúde física e mental, psicotécnico, assegurando- se, também, uniforme especial e porte de arma. O trabalho do vigia, menos abrangente, cinge-se à vistoria patrimonial, sem que se exijam atividades mais complexas e sem exposição eminente ao perigo”.
 
O relator do IUJ citou, ainda, outra linha de raciocínio, que também leva ao indeferimento do adicional de periculosidade aos vigias, extraída do julgamento do recurso ordinário interposto nos autos do processo nº 0000399-28.2015.5.03.0185, cujo relator foi o desembargador Manoel Barbosa da Silva: “A Lei 12.740/2012, que alterou o art. 193 da CLT, estendeu o adicional de periculosidade aos empregados que exerçam atividades que impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial. Este artigo foi regulamentado pelo MTE, através da portaria nº 1.885/2013, cujo anexo 3 da NR-16 vem definir as hipóteses em que o profissional de segurança fará jus ao respectivo adicional. Assim, a referida NR-16 determinou que serão considerados profissionais de segurança, para fins de percepção do adicional de periculosidade, aqueles que forem contratados por empresas privadas que exerçam atividade econômica na área segurança pessoal e patrimonial, registradas e autorizadas pelo Ministério da Justiça, ou se contratados pela Administração Pública conforme as disposições ali contidas. A função exercida pela reclamante não se enquadra dentre as hipóteses normativas. Isso porque a autora não foi contratada por empresa de segurança, devidamente registrada e autorizada para o exercício, conforme preconiza o anexo 3 da NR-16”.
 
Decisão da maioria
 
Inicialmente, o relator observou que, conforme levantamento realizado por ele próprio e pela Comissão de Uniformização de Jurisprudência, não foi localizado precedente específico do TST sobre o tema, o que se credita à recente regulamentação da matéria, carecedora de maturação nos contornos da Justiça do Trabalho. O relator observou ainda que o Ministério Público do Trabalho, na esteira do posicionamento prevalecente, destacou em seu parecer que as funções exercidas pelo vigilante e pelo vigia são substancialmente distintas, e concluiu não ser devido, a este último, o pagamento do adicional de periculosidade previsto em lei.
 
Em razão da considerável distinção entre as funções dos vigias e vigilantes, prevaleceu, no âmbito do TRT mineiro, a corrente jurisprudencial que entende ser incabível o pagamento do adicional de periculosidade aos primeiros. Em consonância com esse posicionamento prevalecente no TRT-MG, o relator acolheu, em parte, o parecer da Comissão de Jurisprudência, sugerindo apenas pequena alteração na redação da ementa por ela elaborada, referente a aspectos da legislação pertinente. Acatando esse entendimento, a maioria do Tribunal Pleno decidiu pela edição de súmula com a redação que espelha a jurisprudência predominante no âmbito do TRT mineiro.
 
Proc. nº 0000558-47.2014.5.03.0171-IUJ. Acórdão publicado em 03/09/2015
Fonte: Site do Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região

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